sexta-feira, 21 de maio de 2010

21. HISTÓRIA DO MARACATU CEARENSE

Reprodução de Jean Baptiste Debret.


Segundo fontes históricas e relatos de personagens ilustres de nossa terra, o maracatu cearense já se mostrava presente desde meados do século XIX sendo o mesmo conhecido por “congadas ou pelo auto dos reis de Congo” que retratavam os combates entre o Congo e Angola e que daria origem não só ao maracatu más também a outras expressões culturais afro-descendentes como o reisado, caboclinhos e os pastoris.

Em Fortaleza a Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos homens pretos (1871), responsável pela construção do templo católico mais antigo de nossa capital homenageando santa de mesmo nome, foi a principal difusora desta tradição cultural que se realizava geralmente ao termino das cerimônias religiosas e culminavam com a coroação do rei e rainha negra. Esta mesma irmandade sociabilizava o escravo forro ou cativo a sociedade fortalezense da época e possibilitava aos mesmos; auxílio funeral, pensões a viúvas e a possibilidade de lazer nas horas vagas, sobre tudo, aos domingos e dias santos com o devido consentimento de seus senhores “no caso de escravos cativos”.

O ponto culminante das congadas era a coroação do rei e da rainha negra que vinham acompanhados pelo seu séquito real composto por negros trajando cores bufantes dos mais variados tecidos e representando personagens da corte portuguesa. Em geral tais roupas eram usadas e doadas a irmandade para que pudessem ser realizadas as encenações como vestidos de noivas amplamente usados para caracterizarem as princesas e rainhas.
Em determinadas épocas do ano a irmandade era contratada por senhores de engenho ou pessoas abastadas para apresentar seus autos, tais contribuições eram depositadas em um caixa controlado pelo tesoureiro sendo responsável o mesmo pelo controle dos bens da confraria que consistiam desde casas a terrenos espalhados pela cidade.

Além da referida irmandade que teria sido o ponto original deste folguedo, em fins do século XIX o maracatu também fazia-se presente em diversos pontos da capital. Segundo o escritor Gustavo Barroso, havia por trás da estação férrea João Felipe o maracatu do Morro do Moinho que saia com seu cortejo real pelo centro em direção a igreja do Rosário onde fazia a coroação de seu rei e sua rainha.

“os últimos reis do Congo que houveram em Fortaleza, minha terra natal, foram o negro Firmino, ex-escravo de meu pai e a negra Aninha Gata. Esta conheci ai por volta de 1897 ou 1898, com pequena quitanda na antiga travessa das flores, entre as ruas Major Facundo e a da Boa Vista, hoje Floriano Peixoto. (BARROSO, 1962, P. 374)

Existiam também os maracatus da rua de São Cosme (atual rua Pe. Mororó), da rua do outeiro (antiga Aldeota – atual região do Colégio Militar), do Beco da Apertada Hora (atual rua Governador Sampaio), do Manoel Furtado, do João Ribeiro localizado ao fim da rua Major Facundo na altura da antiga praça do livramento (atual praça do Carmo). Do negro João Gorgulho (grupo de folguedos africanos – 1910). Segundo Otacílio de Azevedo em seu livro: Fortaleza Descalça;

“vestia-se com roupagem de seda colorida, recheada de fitas e arabescos, minúsculas lantejoulas, vidrilhos e brilhantes pedrarias. Os valetes do rei João Gorgulho vestiam calças de cetim verde, justas ao corpo, coletes violetas, clâmide vermelha caindo sobre os ombros e espadas de papelão dourado. O trono, forrado de fofos de papel de seda salpicado de estrelas, tendo à guisa de cetro uma vara coberta de papel dourado, ficava sobre um tapete de palha de carnaúba colorida, a coroa, feita com folhas de flandres, se apresentava pintada com cores diversas”.

O maracatu cearense difere do pernambucano pois o timbre de seus acordes são mais lentos e cadenciados sendo o batuque composto por caixas sem esteiras visando acentuar a batida grave, bumbos, surdos, ganzás, chocalhos e triângulos aqui chamados “ferros” responsáveis pela cadência ou ritmo característico do cortejo. As loas ou “músicas do maracatu” sempre relatam fatos ou acontecimentos históricos ligados à cultura afro regionais ou nacionais constituindo as mesmas no chamado enredo do maracatu. Seus brincantes ou “maracatuqueiros” apresentam seus rostos pintados com uma mistura de fuligem, óleo infantil, talco e vaselina em pasta que dão o tom ao chamado “falso negrume” expressão difundida pelo pesquisador cearense Gilmar de Carvalho. O macumbeiro(a) ou tirado(a) de loas puxa o enredo sendo o mesmo respondido pelo cordão de negras que impulsiona todo o cortejo a imitá-las. Geralmente tais “tiradores de loas” trajam roupas femininas semelhantes as de negrinhas ou “mucamas” reais podendo os mesmos virem trajando branco com suas guias ou amuletos.

O maracatu chegou oficialmente ao carnaval de rua fortalezense por volta de 1937 através de convite feito pelo famoso rei momo Ponce de Leon ao compositor e carnavalesco Raimundo Alves Feitosa conhecido também como Raimundo Boca Aberta fundador do maracatu Az de Ouro (o mais antigo em atividade). Em meados de 1950 seriam fundadas agremiações de imenso peso histórico como: Estrela Brilhante, Az de Espadas, Leão Coroado. Outros grupos já extintos deixaram saudade como; Rancho Alegre, Nação Africana, Rei de Espadas, Rei dos Palmares, Nação Uirapuru, Nação Gengibre, Nação Verdes Mares e Rancho de Iracema.